sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Caso 35



Ela não se recorda do dia. Não que fosse demasiado nova para ter memórias, mas há dias que se desvanecem da história da gente. Mas tinha a certeza que tinha sido um dia frio com chuva, porque o sol se tinha recusado a estar presente, naquela triste manhã em que Cinderela se despediu de seu pai, um homem profundamente rico, que morrera de saudade.
O pai da Cinderela quando pressentiu que a vida se esfumava, casou com Lady Tremaine, que o seduziu com falsos encantos, exibindo-lhe qualidades que não tinha, convencendo o velho comerciante que seria uma verdadeira mãe para a nossa heroína; mas ainda o corpo jazia no caixão e já a malévola Tremaine mandou Cinderela para o sótão, retirou-lhe o ipad, iphone e iMac, mais as roupas e os colares e os perfumes, obrigando-a limpar o quarto, a sua wc, a colocar a mesa e lavar a loiça; como se não fosse pouco, proibiu-a de sair à noite, para desgosto imenso de Cinderela, que acabara de completar quinze anos.
Anastasia e Drizella as maléficas irmãs, ambas com cerca de trinta anos, filhas de Lady Tremaine passavam o tempo a dizer que Cinderela era feia, burra, que era uma porca e uma pêga, que cheirava mal, que os pais tinham falecido por culpa dela, que não servia para nada, que era uma inútil e uma badalhoca. E o pior, foi um dia em que lhe chamaram gorda!
Anastasia vivia em casa da mãe, com um sensual finalista de serviço social, que depois de terminado um longo namoro, estava pronto para amar e ser amado. Drizella casou com o marido, que tinha 62 anos, mas corpo de 59, curiosamente muito rico; quando percebeu que ele queria doar ao filho um palacete, recusou permitir que ele o fizesse. Antes, Drizella comprou um Ferrari, sem o pagar! Inconformado, o filho do marido de Drizella, rapaz enérgico de 15 anos, adulterou os travões sendo que por isso ela teve um acidente, em que perdeu todos os dentes, sendo que, o marido ficou cego e mudo, uma espécie de marido perfeito. Talvez por isso, ela começou a dançar nua para satisfação de outros homens.
Cinderela vivia triste, sufocada em casa; mas, na noite de Carnaval, finalmente conseguiu sair: porque a madrasta lhe tinha retirado as melhores roupas, falou com uma amiga que estuda serviço social, que lhe fez a caridade de lhe emprestar roupa, arranjar o cabelo, depilar e maquilhar, emprestar perfume e foram juntas a uma festa. E foi lá que conheceu Christian Grey, o temido presidente de uma grande empresa. Logo nessa noite, esgueiraram-se do bar e foram para uma rua escusa, onde, no umbral de um armazém, ele lhe roubou um beijo, daqueles que dura toda uma vida!
Encantado por ela, Christian Grey ofereceu-lhe um iMac, um carro descapotável discretamente vermelho e depois de uma viagem de helicóptero até casa dele, desvirginou-a!
Quid Juris

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Caso 34



Simão Botelho habitava uma rua sem história na cidade de Coimbra. Porque era orfão foi criado como filho do fidalgo de linhagem Domingos Mesquita e Menezes, vivia há um disparate de anos com D. Rita Teresa, mãe do nosso herói. Até ao dia em que Domingos morreu e a família dele expulsou da casa onde moravam D. Rita Teresa, procurando-a privar da vida faustosa que sempre viveu, abandonada na rua, quase sem dinheiro para comprar uma mala Prada, daquelas pretas que ficam bem com tudo. Quem a acollheu foi um tio surdo e careca, depois da família de Domingos ter colocado num site de internet videos de D. Rita a fazer badalhoquices com um amante.
Mas deixemos o drama da mãe e centremo-nos no filho, que quando a puberdade o despertou, começou a sentir uma pulsão amorosa pela sua vizinha, a belíssima Teresa de Albuquerque, que ainda laberguinha, já exibia atributos capazes de deixar louco um jovem imberbe rapaz na potência da idade. Durante semanas que se tornaram em meses, meses que se tornaram anos, namoraram secretamente, como naquela música da Cinderela, em que Carlos Paião conta a história de uma menina de cabelos louros e de um rapaz que tem tesouros para repartir, que trocavam olhares envergonhados, que eram namorados sem ninguem saber e quando a noite os envolvia sonhavam um com o outro.
Mas Tadeu de Albuquerque o pérfido pai de Teresa percebeu o amor da filha e com cólera negou à filha o direito a casar com o dono do seu coração, porque achava insuportável a família de Simão Botelho. Para afastar Teresa, congeminou casa-la com vários pretendentes, até que, derrotado pelas recusas da filha, decidiu fecha-la num convento, onde foi colega de Marianna Alcoforado com quem aprendeu a dizer, promete-me que vais ter saudades minhas, numa das cartas que enviou a Simão. Teresa tinha 15 anos e foi fechada num convento contra a sua vontade. Mas Teresa não era rapariga para cativeiro, pelo logo fugiu do convento; sei pai, colhido de raiva, fechou-a em casa, presa, sem poder nem sequer ir à escola. E foi em casa que um amigo do pai a desvirginou.
Nesse mesmo dia, Manuel Botelho casou, curiosamente com a sua mulher. Uma pecadora imunda, consumista, que dormia com alunas de serviço social, oferecendo-lhes presentes caros, deixando Manuel Botelho cheio de dívidas. E quando ele quis vender uma casa, que já tinha antes do casamento, para pagar aos credores, opos-se, porque usava a casa para encontros ilicitos; quando fugiu com uma doidivanas, deixou um conjunto de dívidas, mobiliário que comprou para a casa, um carro que comprou para passear e contas por pagar na ourivesaria, de presentes comprados para as suas amantes.

Simão, que também tinha quinze anos. tentou resgatar a sua amada, invadindo a casa com uma pistola, tendo baleado Baltazar, primo de Teresa. Detido pela polícia, também ele consegui fugir e esconder-se na casa de um ferreiro, conhecido de seu pai, onde conhece Mariana, que se apaixona por ele, construindo um triangulo amoroso.
Com medo que possa ser preso, Simão foge do país, e carrega consigo a tristeza imensa de assistir à morte de Teresa, tuberculosa. E também ele morre depois. De tristeza, estou certo. Mariana, quando atiram o corpo dele ao mar, joga-se para morrer também, mas é salva por um pescador. Recomposta, decide ser mãe de um filho de Simão, pelo que pretende ser inseminada.

Quid Juris

Caso 33



Mr. Dashwood no leito da morte, chamou o filho John, único filho varão do seu abastado casamento, para lhe fazer um único pedido: implorou-lhe que ajudasse financeiramente a mulher quem partilhava a sua vida e as três filhas, Elinor, Marianne e Margaret.
Quando John, instantes depois da morte do seu pai, partilha com a esposa o pedido final de seu pai, Fanny, que é gaja, faz o que algumas gajas fazem e persuade o marido a ser avarento com as irmãs, privando-as da vida faustosa que estavam habituados, pelo que, a mãe e as três irmãs, são forçadas a mudarem-se para um anexo da casa senhorial de Sir John Middleton, que por caridade a cede gratuitamente, onde reaprendem a viver, com os muito parcos rendimentos que tinham.
Fanny, apaixonada pela fortuna do marido, comprou um carro para ela, outro para ele e outro para o amante, não pagando qualquer das dívidas e, como se não fosse pouco, ainda impediu o marido de vender uma casa que tinha herdado, com vista para o mar, que ele abominava. E como se fosse pouco, Fanny ainda se tornou viciada em cocaína.
É nesta casa que Elionor conhece Edward Ferrars, com quem tem um caso tórrido, com pormenores que não me atrevo a reproduzir, para não roborizar o meu cândido estudante – apenas posso confidenciar, que a dados momentos, ele batia-lhe e ela gostava e implorava por mais- ; sucede, que Edward Ferrars tinha um compromisso sério com Lucy, de quem desde a juventude era secretamente noivo, algo que Elionor apenas descobria quando estava profundamente enamorada.
Marrianne, na sua beleza cruel dos 16 anos, rapidamente arranjou um pretendente, o Coronel Brandson, com mais do dobro da sua idade, mas que se perdeu de amores, mimando Marrianne com sucessivos presentes; mas o coração não é racional nem tem bom senso e Marrianne apaixonou-se por John Willoughby, perigosamente belo, que enganando-a com uma promessa de casamento, desvirginou-a, num esbelto campo, no exacto local onde se viram pela primeira vez, no fatídico dia de chuva em que ela caiu e magoou o pé!
Margaret tinha 15 anos e com a morte do pai, os problemas financeiros da mãe, as paixões assoberbadas das irmãs, habitou-se a crescer sozinha, correndo desacompanhada os perigos e riscos que entendeu; viciada em internet, faltava dias consecutivos à escola para ficar agarrada ao Ipad, em sites recomendados pela Maria, fumando cigarros e outras coisas, não perdendo uma festa, onde reiteradamente bebia demasiado. E foi assim que numa noite fez amor com Sir John Middleton, sexagenário, que lhe ofereceu 10.000 por aquele privilégio. O que Sir John Middleton desconhecia é que Margaret filmou toda a badalhoquice, de forma a chantagear o velho aristocrata! E fê-lo sem sensibilidade nem bom senso…
Quid Juris

Caso 32

 
Foi em Setembro que se conheceram! Ela trazia nos olhos a luz de Maio, nas mãos o calor de Agosto e um sorriso tão grande que não cabia no tempo.
Ele disse-lhe: “ Ouve, vamos ver o mar...”
Foram o 30 de Fevereiro de um ano por inventar, falam coisas tão loucas e acabaram em silêncio, por unir as suas bocas e ele aprendeu a amar. Ainda o relógio marcava dezassete anos!
Mas amou-a como ninguém tinha amado antes. Quis dar-lhe o sol, quis oferecer-lhe as estrelas, mas como lhe faltou o talento ofereceu-lhe um anel, muitas flores, um lingerie sensual comprada nos chineses e um iphone 4, este, com dinheiro que desviou da carteira da mãe.
Foi em Novembro que ela partiu, levou nos olhos as chuvas de Março e nas mãos o mês frio de Janeiro
Lembro-me que ele lhe disse que o seu corpo tremia, mas ele, que queria ser forte, respondeu que tinha frio, falou-lhe do vento norte. Não lhe disse adeus, quem sabe talvez um dia...
Como ele tremia meu Deus! Amou como nunca amou! E nessa noite pela primeira vez na sua vida embebedou-se e acordou num motel com Jeremias, depois de ter comprado ao dono do bar um computador portátil para ir actualizar o Facebook! O dono do bar, um sensual invisual!
Foi louco? Não sei, talvez! Mas por pouco, muito pouco, ele voltaria a ser louco e amá-la-ia outra vez, mesmo sabendo que ela estava dependente da cocaína e roubava-o, tendo mesmo chegado a agredi-lo!
Sim eu sei que tudo são recordações, sim eu sei é triste viver de ilusões, mas esta foi a mais linda história de amor que um dia aconteceu e recordar é viver, ainda que uma Directiva comunitária tenha proibido o casamento antes dos vinte anos, para diminuir a taxa de infidelidade entre os estudantes do ensino superior, porquanto, há a tradição destes alunos beberem demasiado às quintas-feiras e depois perderem a noção do que fazem e com quem fazem!
Sim eu sei que tudo são recordações, sim eu sei é triste viver de ilusões, mas este foi o mais lindo caso prático que um dia me aconteceu!
Quid Juris

Caso 31

 
Eles eram duas crianças a viver esperanças, a saber sorrir. Ela tem cabelos louros, ele tem tesouros para repartir. Numa outra brincadeira passam mesmo à beira, sempre sem falar.Uns olhares envergonhados e são namorados sem ninguém pensar, com medo do pai dela, que lhe prometeu uma sova, se ela namorasse antes dos dezoito anos.
Foram juntos outro dia, como por magia, no autocarro, em pé. Ele lá lhe disse, a medo: "O meu nome é Pedro e o teu qual é?" Ela corou um pouquinho e respondeu baixinho: "Sou a Cinderela, e se queres namorar comigo, tens de oferecer-me um iphone 4 comprado na Worten de Grandola”.
Quando a noite o envolveu ele adormeceu e sonhou com ela...Então, Bate, bate coração, louco, louco de ilusão, que a idade assim não tem valor e ele é menor mas trabalha desde os 16, mas como gasta o dinheiro todo a viajar entre Lagos e Évora, pediu emprestada à avó e ofereceu-lhe a prenda.
Crescer, vai dar tempo p'ra aprender, vai dar jeito p'ra viver, o seu primeiro amor. O seu, do Pedro, que era filho de pai invisual, profundamente rico e de uma mãe leviada, que dormia com outros homens, até mesmo um vizinho barrigudo de barbas grandes que em Dezembro vestia-se sempre de vermelho, presumo por ser do Benfica!
Cinderela das histórias, a avivar memórias, a deixar mistério, já o fez andar na lua, no meio da rua e a chover a sério, embora, quando isso aconteceu, ele tinha bebido demasiado e, perdidamente embriagado, comprou um guarda-chuva amarelo.
Ela, quando lá o viu, encharcado e frio, quase o abraçou, com a cara assim molhada, ninguém deu por nada, ele até chorou...
E agora, nos recreios, dão os seus passeios, fazem muitos planos, e dividem a merenda, tal como uma prenda que se dá nos anos, porque, como se sabe, é tradição dar uma prenda de aniversário.
E, num desses bons momentos, houve sentimentos a falar por si, ele pegou na mão dela: "Sabes Cinderela, eu gosto de ti..."